As doenças respiratórias são uma das principais causas de morte no mundo e em Portugal, mas nem por isso têm a proporcional atenção mediática e nem a pandemia do covid-19, tratando-se de uma doença respiratória, ajudou nessa visibilidade.
A mediatização não é uma necessidade em si mesma, mas é importante porque incrementa o nível de sensibilização, seja a montante, na construção das políticas públicas adequadas, seja a jusante, na sensibilização da sociedade para os riscos e formas de prevenção.
Num estudo apresentado em 2021, feito pela Escola Nacional de Saúde Pública com o apoio da Associação Portuguesa dos Cuidados de Saúde ao Domicílio, foi sublinhado que “a elevada prevalência do tabagismo, o excesso de peso na população portuguesa, o subdiagnóstico da Doença Pulmonar Obstrutiva Crónica (DPOC) e Síndrome de Apneia Obstrutiva do Sono (SAOS) e o aumento de sobrevida de pessoas com doenças respiratórias graves, como doenças neuromusculares e outras doenças raras, fazem antever que nas próximas décadas, o número de pessoas com doença com tratamentos de Cuidados Respiratórios Domiciliários continue a aumentar”.
Em Portugal, em junho de 2020, mais de 160 mil utentes do Serviço Nacional de Saúde (SNS) beneficiavam no seu domicílio deste tipo de cuidados que, durante a pandemia, se revelaram como uma verdadeira reserva estratégica do SNS, pelo suporte que deram a milhares de doentes que precisaram de apoio respiratório e que o puderam ter no recato do lar, retirando pressão às unidades hospitalares.
Desde 2014 que os Cuidados Respiratórios Domiciliários têm um modelo virtuoso de contratualização, naquele que foi um dos primeiros acordos-quadro feito em Portugal — e inovador na Europa — no sector da saúde, que veio garantir a equidade geográfica, veio permitir que a escolha do prestador seja feita pelo utente, que veio assegurar a melhor concorrência na qualidade do serviço, que veio criar uma solução digital para a gestão de todo o ciclo e que se passou a regular pelas Normas de Orientação Clínica, da Direção Geral da Saúde.
Graças a esta solução virtuosa e à introdução da Prescrição Eletrónica Médica, foi, também, possível obter, ao longo do tempo, dados muito úteis para a compreensão deste modelo de prestação de cuidados, a par da monitorização da evolução da prevalência destas terapias.
Neste quadro, e no âmbito do estudo que referi, foi possível identificar janelas de oportunidade para melhorar substancialmente o percurso da pessoa com doença crónica com terapias respiratórias domiciliárias, nomeadamente através da criação de programas integrados de gestão focados na boa navegabilidade do utente no ecossistema de saúde.
Uma melhoria em linha, aliás, com os “Cenários da Saúde em 2040”, apresentado pela Ordem dos Médicos, que refere a necessidade de centrar os cuidados na pessoa e não no serviço ou no prestador.
Por outro lado, através deste conhecimento agregado, o SNS poderá, ainda, antecipar estratégias e, assim, acomodar o aumento do número de pessoas que crescentemente vão sofrer de doenças respiratórias e vão ficar dependentes destas terapias.
A par deste planeamento, mostra-se cada vez mais relevante orientar as políticas públicas no sentido de potenciarem o “valor” como ferramenta de boa gestão na prestação de cuidados de saúde. E neste propósito, os Cuidados Respiratórios Domiciliários, pela sua experiência, capacidade de inovação e proximidade com esta população devem ser considerados um exemplo inovador para a aplicabilidade deste paradigma da “saúde baseada em valor”.
Contudo, no início desta cadeia de valor tem de estar a sensibilização para a promoção para a saúde e para a vida saudável e, quando a doença se torna incontornável, é preciso apoiar o doente na literacia para as patologias e para a sua reabilitação.
Mas, por mais inovadoras e arrojadas que forem as políticas e as soluções, o ato crónico de respirar dependerá sempre do compromisso do doente em aderir à terapêutica.
A autora escreve segundo o Acordo Ortográfico de 1990