OS FACTOS

Portugal é um país em processo acelerado de envelhecimento e os números comprovam-no: em 1974, existiam 34,9% de idosos por cada 100 jovens, valor que aumentou para 80,5% em 1994. Em 2022, segundo a Pordata, o indíce de envelhecimento era de 183,5%.

De acordo com dados do Eurostat para 2022, a população portuguesa é a que está a envelhecer a um ritmo mais acelerado entre os 27 Estados-membros da União Europeia (UE). No mesmo sentido, a análise dos resultados do Censos 2021 evidencia que 23,4% da população em Portugal tem 65 anos ou mais.

Os registos sobre a natalidade deixam a claro a realidade de um país cada vez menos jovem. Valores da Pordata apontam que a taxa bruta de natalidade tem vindo a cair desde a década de 60: em 1964, era de 24%, número superior ao registado em 1974 (19,6%), em 1984 (14,3%), em 1994 (10,9%), em 2004 (10,4%) e em 2014 (7,9%). Em 2022, o último ano de que há registo, a taxa fixou-se em 8% – neste período nasceram 83.915 bebés, mas ainda assim morreram mais pessoas do que aquelas que nasceram e o saldo natural ficou-se por -40,6%.

foi o saldo positivo registado pela Segurança Social em 2022 no que respeita à diferença entre as receitas obtidas através dos imigrantes (€1861 milhões) e os apoios pagos a esta população (€257 milhões)

Quando o tema é a demografia, os fluxos migratórios ganham relevância por serem apontados, com frequência, como potencial resposta ao desafio do envelhecimento da população portuguesa. Segundo dados compilados pela Pordata a propósito do Dia Internacional dos Migrantes, que se assinalou a 18 de dezembro, dos 118 mil imigrantes que entraram no país em 2022 cerca de 62% eram homens e metade tinha entre 15 e 44 anos de idade, enquanto 24,5% tinha mais de 55 anos.

“Nos últimos 62 anos, 30 foram marcados por saldos migratórios negativos, em 3 períodos concretos: de 1961 a 1973, de 1983 a 1992 e, mais recentemente, de 2011 a 2016. Atendendo a que o saldo natural tem sido negativo desde 2009, o crescimento da população observado a partir de 2019 tem-se devido à entrada de imigrantes em Portugal”, lê-se no documento publicado pela Pordata.

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Portugal é cada vez mais um país de destino para milhares de migrantes com origem na UE (com os naturais do Reino Unido a liderar, seguidos de franceses e italianos) e fora do espaço Shengen (com Brasil, Cabo-Verde e Índia no topo da lista). Em 2022, eram mais de 781 mil estrangeiros com autorização de residência em território nacional, sensivelmente o dobro dos 183 mil registados em 2015.

Num país que tem promovido a sua “geração mais qualificada de sempre”, mas que assistiu, em 2022, à saída permanente de 29.523 portugueses para o estrangeiro – cerca de metade com formação superior -, o investigador Pedro Góis questiona se “a imigração laboral é complementar ou se se substitui à emigração laboral portuguesa”. Para o sociólogo da Universidade de Coimbra, “em alguns casos trata-se de complementaridade (como no turismo)” e noutros será uma “substituição progressiva (como na agricultura)”. A procura de “trabalhadores com um custo salarial inferior aos dos trabalhadores autóctones” é uma realidade em Portugal e noutros países, que leva “os portugueses a emigrar para a Suíça ou para o Luxemburgo e os cabo-verdianos, nepaleses ou brasileiros a procurar Portugal como destino migratório”, explica o especialista.

“Sem os imigrantes, alguns sectores económicos entrariam em colapso”, considera a diretora do Observatório das Migrações, Catarina Reis Oliveira

O último relatório anual do Observatório das Migrações (OM) aponta que nem todas as origens da imigração ajudam a endereçar o desafio demográfico. “Se a imigração de origem de países terceiros à União Europeia atenua o envelhecimento demográfico, a imigração de cidadãos comunitários, pelo contrário, exacerba esse envelhecimento”, aponta o organismo. Em 2022, mais de 16,7% do total de bebés nascidos em Portugal eram de mãe com nacionalidade estrangeira, num total de 14.003 crianças.

Mas há outras questões a considerar, nomeadamente ao nível económico. Dados recentes da Segurança Social (SS) mostram que, em 2022, as contribuições dos imigrantes para esta entidade bateram recordes e atingiram, pela primeira vez, €1861 milhões. Estes valores resultam num balanço positivo entre a entrada de receita nos cofres da SS (€1861 milhões) e a saída de prestações sociais para imigrantes (€257 milhões), num saldo positivo de €1604,2 milhões. “Sem os imigrantes, alguns sectores económicos entrariam em colapso”, considera a diretora do OM, Catarina Reis Oliveira, apesar de, segundo os dados, ser esta camada da população mais precária do que a nacional. Em Portugal, diz o Eurostat, 34,9% dos estrangeiros tem contratos de trabalho temporários, um valor apenas superado por países como a Polónia (36,3%), os Países Baixos (37,6%) ou a Croácia (47,9%).

PARA ONDE CAMINHAMOS

Para Pedro Góis, da Universidade de Coimbra, a realidade é clara: “não parece haver grandes dúvidas quanto ao impacto de emigração e imigração na população portuguesa ao longo das últimas cinco décadas. Sempre que a imigração se retrai mantendo-se constante a emigração, a população total decresce”. O investigador cita ainda as projeções do Instituto Nacional de Estatística para 2022, que apontam para que, pelo quarto ano consecutivo, exista em Portugal “um crescimento populacional”.

Porém, reconhece o perito, os fluxos migratórios têm sido inconstantes ao longo das últimas décadas no país, o que tem dificultado a adoção de medidas estruturadas para dar resposta aos movimentos de saída do país e aos de entrada no território. “Importa construir uma estratégia dinâmica que permita valorizar e apresentar uma resposta institucional e societal e que, simultaneamente, possibilite enquadrar os diferentes tipos de migrantes e respetivos interesses”, considera Pedro Góis.

Para o Observatório das Migrações, representado por Catarina Reis Oliveira, “a imigração para Portugal é essencialmente de motivação económica” e, neste contexto, “a entrada de imigrantes permite ao país reforçar os grupos etários mais jovens e em idade ativa, atenuando o envelhecimento demográfico”. Ao longo dos últimos oito anos, o crescimento da população estrangeira em território nacional tem permitido melhorar as contas da Segurança Social, dar resposta à dinâmica do mercado de trabalho em sectores como o turismo, a agricultura ou a tecnologia, mas persistem desafios que devem ser endereçados. Entre eles, enumera Pedro Góis, a parametrização do “sistema burocrático-administrativo” e a construção de “mecanismos de avaliação para determinar se as políticas alcançaram o resultado desejado ou o impacto procurado”.

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