O primeiro-ministro, Luís Montenegro, começou a sua intervenção na sessão solene de inauguração da 40ª Feira do Alentejo – Ovibeja com uma indirecta que tinha um destinatário: o anterior Governo. “Desta vez, a minha presença significa a reconciliação do Governo da República com a Ovibeja”. Com efeito, a sua comissão organizadora, a Associação de Agricultores do Sul, decidiu no certame de 2023 não convidar nenhum membro do Governo, alegando que não fazia qualquer sentido convidar “quem não ouve a contestação dos agricultores”, visando então a ex-ministra da Agricultura Maria do Céu Antunes.
Feito o reporte, Montenegro disse que o Governo não é indiferente à realidade que afecta a vida dos agricultores, lembrando que os últimos anos trouxeram alguns problemas que urge estancar, destacando a onda de protestos a que Portugal assistiu e outros países da Europa nos últimos meses.
“É uma nova realidade” que não poder ser escamoteada, sinalizou o primeiro-ministro, admitindo que o protesto dos agricultores veio revelar que a “indignação foi motivada por anos de abandono que acabam por nos colocar perante uma situação de masoquismo”. Com efeito, as restrições impostas aos agricultores europeus para preservar o meio ambiente e a saúde pública não estão a ser colocadas aos produtos vindos de fora. “Exigimos para nós regras restritivas para salvaguardar o meio ambiente e a saúde pública, mas fechamos os olhos a produtos agrícolas provindos de outras geografias que não respeitam os princípios que são impostos no quadro comunitário” vincou o governante.
Esta realidade também ajuda a compreender porque subsistem as baixas taxas de jovens agricultores em Portugal, cerca de 14%, quando há países europeus com taxas acima dos 50%.
Outra medida anunciada pelo primeiro-ministro vem ao encontro da reivindicação expressa pelo presidente da Associação de Agricultores do Sul, Rui Garrido. Este dirigente associativo deu expressão a uma preocupação maior dos agricultores nos tempos que correm: “A agricultura debate-se com o fenómeno das alterações climáticas”.
A escassez de água, salienta, “leva ao abandono dos campos, à cessação da actividade agrícola e ao caminho para a desertificação”.
E o futuro a médio e longo prazo parece garantir uma tendência para menor pluviosidade, e mais irregular, com o sul do país sujeito a fenómenos extremos e mais imprevisíveis. Os períodos de seca e as ondas de calor serão mais frequentes e por períodos mais alargados. “É evidente a necessidade de construção de mais reservatórios de água no sul de Portugal e a materialização de uma alternativa baseada no transvase que desloque a água das regiões do norte onde a pluviosidade é bastante superior à do sul”.
Rui Garrido defende a “urgente a aplicação de uma política nacional” de recursos hídricos para Portugal. “Nós estamos empenhados o mais rápido que conseguirmos em considerar um Plano Nacional de Armazenamento e Gestão da Água”, reforçou Luís Montenegro, destacando o que considera ser uma questão de fundo: “Mais que um problema de falta de água, temos acima de tudo um problema de gestão de recursos hídricos”, cujas resposta têm sido “sucessivamente adiadas”.
O primeiro-ministro comprometeu-se em apresentar ao país, com urgência, uma estratégia que “consolide os vários interesses”, o humano, o da valorização da agricultura, do turismo e de outras actividades económicas, adianta, frisando que “não deve haver tabus “.
“O que tem de haver é boa gestão e conciliação de interesses”, disse.
O presidente da Câmara de Beja, Paulo Arsénio, munindo-se de dados da Pordata, salientou a importância da nova agricultura que está a ser dinamizada por Alqueva. “Em 2023, o Alentejo exportou 314 milhões de euros em produtos agrícolas, quando em 2001, um ano antes do encerramento das comportas de Alqueva, as exportações da região ficaram pelos 5,3 milhões de euros.
Só no concelho de Beja, o regadio ocupa 35 mil hectares e os novos blocos de rega em construção poderão chegar aos 40 mil hectares. A dimensão do espaço agrícola baseado na exportação de azeite, amêndoa, milho e vinho, trouxe um problema novo: a reposição das vias de comunicação, sobretudo as estradas municipais que não foram dimensionadas para a circulação de máquinas e viaturas com elevada tonelagem.
A sua recuperação e manutenção representa um acréscimo de custos para o município de Beja. Em três estradas, e numa extensão de 28 quilómetros, a autarquia terá de suportar um encargo de 5,5 milhões de euros, quando a derrama representa uma receita de apenas 1,6 milhões de euros para o município.
Os fluxos migratórios e outro dos recentes fenómenos não tem existido resposta suficiente, apesar de representarem uma “pressão extrema” sobre o concelho, alerta Paulo Arsénio, que propôs ao primeiro-ministro a necessidade de “ajustar” as entradas de imigrantes em território português, exigindo que as empresas de contratação de mão-de-obra imigrante apliquem outros critérios na sua contratação, que impeçam as condições degradantes que actualmente se observam.