Desde 2019, quando visitou Itália, que o líder chinês não entrava em solo europeu. A viagem começa este domingo, em França, mas ainda passará pela Sérvia e pela Hungria. A escolha dos países não é inocente, numa altura em que as tensões entre a União Europeia (UE) e a China estão elevadas, o presidente chinês fará de tudo para afastar o ‘Velho Continente’ da América e para amenizar as relações.

De formas diferentes, os três países escolhidos por Pequim olham com desconfiança para alguns dos ideais norte-americanos ou mesmo a relação próxima que a Europa tem com os Estados Unidos e não descartam nenhum relacionamento económico.

As tensões comerciais

Xi Jinping inicia a sua visita em França, um dos ‘gigantes’ da UE. Nas últimas semanas, as relações com o bloco europeu não têm sido as melhores, pois a UE lançou investigações comerciais sobre vários equipamentos chineses e chegou a invadir os escritórios do fabricante chinês de equipamentos de segurança Nuctech como parte de uma investigação sobre subsídios. E esta semana o chefe comercial da Comissão Europeia sugeriu que as taxas sobre os veículos elétricos chineses poderão ser impostas até junho, após o lançamento de uma investigação sobre o apoio estatal à fabricação de carros elétricos na China.

Além do mais, a Alemanha e o Reino Unido também prenderam ou acusaram, nos últimos dias, pelo menos seis pessoas por alegada espionagem e crimes relacionados ligados à China.

Já em março, a Itália oficializou a sua saída da “Nova Rota da Seda”, acordo económico assinado com a China em 2019, quando da última visita de Xi à Europa, tendo sido o único país do G7 a aderir.

Mas as tensões não se agravaram apenas de um lado. Ainda no início do ano a China abriu uma investigação sobre o preço do brandy importado da UE, uma medida que poderá atingir o setor do conhaque francês e é amplamente vista como uma retaliação às várias investigações que têm sido iniciadas na Europa. Nas suas reuniões, Xi provavelmente irá insistir na mensagem de que “descartar” a China é perigoso para a Europa, uma mensagem que já passou ao chanceler alemão na última visita que este fez a Pequim.

“A China é vista cada vez mais como uma ameaça multifacetada em muitas capitais europeias. Mas há divisões na Europa sobre a rapidez e o alcance a seguir na abordagem das preocupações sobre a China, tanto nas esferas económicas como de segurança”, disse à “CNN” Noah Barkin, membro do Fundo Marshall Alemão dos Estados Unidos, baseado em Berlim.

O líder chinês deverá encontrar-se com a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, ao lado do presidente francês, Emmanuel Macron, na segunda-feira.

As relações com os EUA…

Xi não visita França apenas por ser um dos grandes países europeus, mas também porque Macron é um dos líderes que quer manter uma certa distância em relação aos Estados Unidos.

Não é novidade que as relações entre a China e os Estados Unidos têm de ser feitas com todos os cuidados e têm-se agravado nos últimos anos, com uma guerra comercial que se tem focado, particularmente, na tecnologia, sendo os mais recentes visados a marca Huawei e a rede social TikTok.

Com Macron, com quem se irá reunir em Paris e ainda nos Pirinéus, Xi tentará “ver se consegue distanciar mais a Europa da América do Norte”, disse à “CNN” Chong Ja Ian, professor associado de ciência política na Universidade Nacional de Singapura.

Na última vez que Xi, Macron e von der Leyen estiveram juntos foi em abril de 2023, em Pequim. Na altura, França saiu com 18 acordos com empresas chinesas e Macron disse aos jornalistas que a Europa não deveria tornar-se “seguidora da América” na questão de Taiwan. No mês passado, Macron voltou a dizer o mesmo, num discurso na Sorbonne, defendendo que a UE não “deve ser vassalo dos EUA”. Na sua ótica, a sobrevivência do bloco depende da sua “autonomia” e do desenvolvimento militar.

Xi sabe o que faz. Antes de aterrar em França, na antecipação à visita, elogiou o país como uma grande potência e expressou esperança de que os seus laços “estarão sempre na vanguarda das relações da China com os países ocidentais”.

…e com a Rússia

A guerra na Ucrânia é um ponto sensível nas relações entre a UE e a China e também deverá estar na agenda das reuniões no início desta semana. O problema é que Pequim parece ter feito pouco para levar a Rússia em direção à paz, mesmo indicando que é essa a solução que deseja.

A visita de Xi ocorre num momento em que os EUA e os seus aliados europeus se manifestam cada vez mais sobre as preocupações de que as exportações chinesas de bens para a Rússia estejam a alimentar a sua máquina de guerra. Pequim defende esse comércio como parte regular das suas relações bilaterais.

É expectável que Macron e von der Leyen alertem o líder chinês de que as relações com a Europa dependem da sua posição em relação à invasão russa, segundo escreve a imprensa internacional.

O fim das críticas

Nem todas as visitas serão tão sensíveis como aquela em que tem início a viagem. A visita à Sérvia, que não faz parte da UE, e à Hungria, que cada vez mais se distancia das políticas europeias, serão menos controversas – e também, por isso, destinos bem escolhidos por parte dos políticos chineses. “Os seus líderes [da Hungria e da Sérvia] acolhem com satisfação o investimento chinês e não têm problemas com o aprofundamento dos laços da China com a Rússia”, disse Noah Barkin.

A visita de Xi a Belgrado coincidirá com a semana do 25º aniversário do bombardeamento da NATO à embaixada chinesa em Belgrado, que matou três pessoas. O ataque, parte de uma campanha de bombardeamento mais ampla da NATO nos Balcãs durante a Primavera de 1999, agravou as relações entre a China e os EUA.

Durante a visita, o líder chinês poderá procurar destacar os investimentos chineses em Belgrado e Budapeste, por forma a deixar a mensagem ao resto da Europa.

A Hungria emergiu, recentemente, como um centro de produção para os fornecedores automóveis chineses, incluindo os fabricantes de veículos eléctricos – uma situação que os analistas ouvidos pela imprensa internacional dizem que poderá ajudar as empresas chinesas a contornar as taxas da UE. De notar que a Hungria já é a maior base da Huawei fora da China.

Em troca, Orbán tem apoiado abertamente a China em fóruns internacionais. Em diversas ocasiões, a Hungria opôs-se às moções críticas da UE à China em matéria de direitos humanos.

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