Só Estaline se perpetuou mais anos na função. O antigo ditador soviético liderou a URSS por 29 anos. Vladimir Putin, hoje empossado novamente Presidente, perfará 30 longos anos de liderança (presidencial; também foi primeiro-ministro) em 2030, aquando do fim do mandato — podendo voltar a candidatar-se (é o que diz a Constituição por ele, Putin, revista “à medida” em 2020) pelo menos mais uma vez.

No discurso de posse de Putin, no Grande Palácio do Kremlin, o cinco vezes Presidente apontou ao Ocidente. Preparado para “dialogar” e vir a ser um “parceiro honesto”, Vladimir Putin também lançou farpas: “Veremos se continuam a travar o desenvolvimento do nosso país e a exercer pressão sobre o nosso país ou se procuram formas de cooperar connosco”.

Sobre estes eleições, que nem de propósito o Ocidente considerou nada livres e nada justas, Putin agradeceu a quem nele confiou. “Somos uma nação única e grande e, juntos, venceremos todos os obstáculos e concretizaremos tudo aquilo com que sonhamos.” Já sobre a ofensiva na Ucrânia, novo momento de gratidão: “Gostaria de agradecer aos participantes na operação militar especial. Gostaria de agradecer a todos os que estão a lutar pela nossa pátria”.

Mais notadas do que as presenças, foram notadas muitas ausências nesta tomada de posse. A França enviou um embaixador, também a Hungria o fez. A Eslováquia destacou um encarregado de negócios. E foi tudo da União Europeia. Aliás, o chefe da diplomacia europeia, Josep Borrell, também ausente, explicou de véspera que seria uma “contradição” estarem países da UE presentes. “É muito difícil de compreender para os ucranianos e para muitas pessoas em todo o mundo”, acrescentou Borrell, lembrando que Putin tem sobre si um mandado de captura do Tribunal Penal Internacional.

O porta-voz do Kremlin, Dmitri Peskov, preferiu, contudo, ver este copo meio cheio — e minimizou a ausência de representantes diplomáticos e responsáveis ocidentais. “Em primeiro lugar, isto [cerimónia] é para os cidadãos da Rússia que votaram no seu Presidente, tudo o mais é secundário. Retaliar? Não creio que isto seja motivo para retaliar”, assegurou o porta-voz.

Numa outra nota, no dia em que a Organização para a Proibição de Armas Químicas afirmou que são “insuficientemente fundamentadas” as informações recebidas (os EUA acusaram Moscovo da utilização de cloropicrina contra as tropas de Kiev) sobre utilização de armas químicas na Ucrânia, Alexander Lukashenko, Presidente da Bielorrússia e fiel de Putin, ordenou esta terça-feira exercícios com armas nucleares táticas russas, instaladas ali em 2023. Lukashenko fê-lo hoje, Putin ordenou (embora para “um futuro próximo) o mesmo segunda-feira. Ambos estão contra as “ameaças do Ocidente”.

A ameaça ocidental que espoletou isto parece ter sido Macron. O Presidente francês insistiu, em entrevista, na semana passada, que se a Rússia “conseguir romper as linhas da frente, se houvesse um pedido ucraniano, deveríamos legitimamente colocar-nos a questão” do envio de militares ocidentais para solo ucraniano.

Além de ponderar exercícios nucleares, o Kremlin também convidou o embaixador francês para uma reunião, onde denunciou a política “provocatória” de Paris em relação ao conflito na Ucrânia. A França reagiu através de comunicado hoje divulgado pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros: “Constatamos que os canais diplomáticos estão mais uma vez sequestrados para fins de manipulação de informação e de intimidação”.

De visita à Europa (é a primeira vez em cinco anos), o Presidente chinês Xi Jinping avisou Macron em Paris: “Opomo-nos à utilização da crise ucraniana para culpar outros, difamar um terceiro país e desencadear uma nova Guerra Fria”. Avisou, para depois lembrar que a China tem “um papel positivo” nas negociações de paz. Macron ouviu, concordou e elogiaria “os compromissos” de Pequim ao “abster-se de vender armas” a Moscovo.

OUTRAS NOTÍCIAS

⇒ O Serviço de Segurança da Ucrânia anunciou, esta terça-feira, ter detido dois coronéis do Departamento de Proteção do Estado pelo envolvimento numa conspiração russa para matar o Presidente ucraniano Volodymyr Zelensky. “O ataque terrorista, que deveria ser um presente para Putin antes da tomada de posse, foi de facto um fracasso dos serviços especiais russos. Mas não devemos esquecer que o inimigo é forte e experiente e não pode ser subestimado”, avisou Vasili Maliuk, o chefe do Serviço de Segurança da Ucrânia.

⇒ O Alto Comissariado da ONU para os Direitos Humanos pediu à Rússia que “pare imediatamente” os ataques a jornalistas independentes no país. “Os contínuos ataques à liberdade de expressão e a criminalização do jornalismo na Rússia são muito perturbadores”, sublinhou o alto-comissário Volker Türk, lembrando que “pelo menos 30 jornalistas estão atualmente detidos na Rússia, sob várias acusações criminais”. E acrescentou: destes, “pelo menos sete foram sujeitos a acusações administrativas ou criminais, nomeadamente por criticarem as ações da Rússia na Ucrânia”.

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