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Reforma tributária: produção melhorará, mas antes economia vai conviver com burocracia de 2 regimes

ESPECIAL PARA O ESTADÃO – Em cerca de dez anos, quando o novo sistema tributário estiver plenamente em vigor, é esperado que todos os setores da economia ganhem com a reforma por causa de seus efeitos sobre a produtividade com a simplificação das regras. Até lá, porém, a fase de transição, que começa em 2026, vai aumentar custos com a burocracia por causa da convivência entre os dois sistemas.

À parte desse processo, há consenso entre analistas de que o setor industrial é o que terá mais ganhos com a redução de custos operacionais, da carga tributária, maior segurança jurídica, melhora da produtividade e, consequentemente, mais investimentos. “Hoje a indústria é muito tributada e, com a reforma, a tributação passará a ser mais normal”, diz Armando Castelar, pesquisador associado do Ibre/FGV.

Do lado oposto, a área de serviços também tem unanimidade como sendo a mais prejudicada, pois seus impostos vão aumentar. Já foi criada, porém, uma lista de exceções para vários segmentos – educação, saúde, escolas, hospitais, laboratórios, dentistas, fisioterapeutas e psicólogos terão desconto de 60% na alíquota do Imposto sobre Valor Adicionado (IVA), que substituirá vários tributos.

Angelo Ambrizzi, responsável pela área tributária do escritório Marcos Martins Advogados, ressalta que a carga para a indústria, hoje, é de cerca de 32% a 34%, enquanto para os serviços é de cerca de 20%. Com a reforma, serão igualadas e devem ficar entre 25% e 27%, alíquotas previstas pelo governo para o IVA.

Exportação de tributos

Os exportadores também terão ganhos relevantes com a desoneração plena das exportações, acabando assim com o acúmulo de créditos que levam muitos anos para serem resgatados. O governo promete ainda agilizar a devolução dos saldos acumulados em até 180 dias. Nesse caso, serão privilegiadas tanto indústrias quanto o agronegócio.

“Por causa desse problema, o setor exportador costuma dizer que o Brasil exporta tributos e, por isso, o produto brasileiro não é competitivo em outros mercados”, afirma Marcus Vinicius Gonçalves, sócio-líder da área de Impostos da KPMG no Brasil.

O comércio deve se manter mais ou mesmo como é hoje, na opinião de Angelo Ambrizzi, responsável pela área tributária do escritório Marcos Martins Advogados. Já o agronegócio, que tradicionalmente é beneficiado, vai contar com tarifas menores ou isenções em vários produtos da cesta básica. Para Gonçalves, a tendência é de a reforma ser neutra para o setor, mas isso depende da regulamentação a ser aprovada no Congresso”.

Sem incentivos fiscais

Entre as vantagens para o setor industrial, a economista e sócia da Tendências Consultoria, Alessandra Ribeiro, cita a tributação no destino, que vai beneficiar especialmente as empresas que operam com longas cadeias de fornecedores, pois haverá mais agilidade e redução de custos. “Isso vai facilitar novos investimentos”, afirma.

Só ficam de fora da lista de maiores ganhos na indústria as empresas que se beneficiam de incentivos fiscais, pois terão aumento de carga com o fim do benefício, pondera Gonçalves. Mas, olhando a reforma de maneira mais macro, ele acredita que “todo mundo vai se beneficiar da simplificação do nosso sistema tributário, que talvez é o mais complexo do mundo”.

O aumento de carga na área de serviços será maior entre aqueles prestados diretamente ao cliente final. Estão na lista os segmentos de telecomunicação, serviços digitais e aviação voltada ao transporte de passageiros.

Para Lorreine Messias, economista do Instituto de Ensino e Pesquisa (Insper), é possível que no curto prazo segmentos da área de serviços sintam os efeitos negativos da reforma, mas é esperado que, no médio e longo prazo, se reorganizem. “Será preciso buscar ganhos de produtividade de outras maneiras que não por vias tributárias, já que é um ganho artificial, pois a sociedade está pagando para que aquele setor sobreviva.”

Reforma será mantida?

Sergio Vale, economista-sócio da Tendências Consultoria, não vê setores perdedores no longo prazo. “Todos ganham, talvez alguns mais que outros”, afirma. Ele pondera que será preciso esperar os primeiros anos da introdução do novo sistema para avaliar melhor os impactos setoriais que, em sua opinião, vão demorar a ocorrer.

Até 2033, quando o ciclo de adoção do novo sistema tributário se encerra, pode até ter um custo tributário adicional por causa dos dois sistemas que vão funcionar ao mesmo tempo, mas lá na frente isso se resolve, afirma Vale. Os impactos na produtividade também só devem ser percebidos de forma melhor após o fim do processo.

“Até porque”, ressalta Vale, “vamos precisar entender se a reforma vai se manter como está pois nesse período teremos duas trocas presidenciais e duas mudanças no Congresso”. Além disso, novas exceções poderão ser incluídas no meio do caminho, assim como possíveis judicializações, principalmente em razão talvez das exceções que estão sendo incluídas no texto da reforma.

Com previsão de ser votada pela Câmara nos próximos dias, a regulamentação da reforma ainda pode ganhar mudanças. Tereza Fernandes, da TF Consultoria, lembra que há muitos setores reivindicando, por exemplo, exclusão do grupo que pagará o Imposto Seletivo – sobretaxa para produtos considerados nocivos ao meio ambiente e à saúde humana. Entre eles estão o automotivo e o de mineração. “O cabrito que mais berrar é aquele que vai ganhar”, diz ela.

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