O Conselho Superior de Segurança do Ciberespaço deliberou e os operadores de telecomunicações ficaram obrigados a excluir os equipamentos da Huawei das redes móveis de quinta geração (5G). A interdição da marca chinesa nunca foi anunciada a título oficial e apenas os operadores de telecomunicações a confirmaram, mas Luís Correia, professor do Instituto Superior Técnico e investigador na área das telecomunicações, não se mostra convencido com a decisão aplicada ao mercado de telecomunicações português.

“É uma decisão política ou de outra natureza qualquer. Seguramente não é técnica, porque se for técnica está profundamente errada”, responde o especialista em telecomunicações em entrevista ao Futuro do Futuro.

Nuno Raposa

Luís Correia recorda que uma rede de telemóveis é composta por área de rádio, que agrega antenas e componentes que captam comunicações em diferentes frequências, e a área de núcleo (ou essencial), que abrange servidores, entradas e outros equipamentos que encaminham e recebem dados que são captados pelas antenas para estabelecer comunicações com diferentes destinatários.

Na área de rádio, Luís Correia diz não haver razão para qualquer tipo de exclusão de marcas porque esta área, alegadamente, não oferece riscos para a segurança nacional. Em contrapartida, na área do núcleo considera que pode haver riscos, mas não são exclusivos da Huawei: “Da parte do rádio não há questões de segurança. Ou seja, não há qualquer possibilidade, quer da confidencialidade, quer do acesso, quer de integridade, de isso ser afetado na rede, na parte do rádio. Não essencial pode haver (riscos de segurança), claro. Mas pode haver para qualquer fabricante. Não para um em especial. Aliás, nós tivemos um exemplo recente em Portugal, que não tem a ver com nenhum dos fabricantes”, defende o especialista em telecomunicações, recordando o ciberataque que provocou um apagão na rede da Vodafone em 2022.

Ilustração de um rede sem fios que opera a partir do interior do corpo humano

DR

Para os dois desafios que costumam ser colocados no Futuro do Futuro, Luís Correia trouxe uma variação que leva um som a escalar entre os 20 e 20 mil Hertz e ainda uma imagem que pretende ilustrar como é que se pode instalar uma rede dentro do corpo humano.

De resto, boa parte da carreira de Luís Correia foi feita a olhar para o futuro das telecomunicações. E é com base na participação no desenvolvimento de normas como GSM (a segunda geração de telemóveis) e diferentes projetos de investigação europeus que o investigador aceita fazer uma previsão sobre o telemóvel do futuro. E neste caso é bem possível que o dispositivo preferido da humanidade passe mesmo para a frente dos olhos de cada utilizador. “Já estamos a ver o princípio do novo telemóvel, entre aspas. São uns óculos”, prevê Luís Correia.

imagem aliança

Que voz é esta?

Há cerca de 10 anos a Google tentou lançar uns óculos de realidade aumentada que acabaram por falhar. Luís Correia admite que começam a ficar reunidas as condições para que, nos próximos tempos, comecem a surgir óculos que refletem imagens nas lentes para adicionar informação de contexto, novidades e explicações relativamente às coisas que as pessoas vão vendo.

A Apple já tem os Vision Pro, e já há outras empresas a desenvolver óculos semelhantes. Aquilo que se prevê é que, num futuro relativamente próximo, aquilo que ainda é um dispositivo muito pouco amigável, porque é grande, pesado e essas coisas todas, fique mais próximo dos óculos normais que as pessoas têm”.

Na origem desta previsível evolução está o reconhecimento de voz e a Inteligência Artificial, que permite que as diferentes máquinas passem a dar resposta a diferentes comandos verbalizados pelos humanos. “Nós já falamos com o telemóvel, já não precisamos de teclado para nada, porque ao falarmos com um dispositivo, o dispositivo já nos entende”, refere Luís Correia. “A expectativa é que, num futuro relativamente próximo, o telemóvel seja ultrapassado, digamos assim, pelos óculos” acrescenta.

Susan Rodrigues

Retratos de abril

O leilão do 5G já lá vai – mas é devido ao leilão que Meo, NOS e Vodafone deverão passar a contar com concorrência no mercado de consumo. A romena Digi deverá estrear uma nova oferta comercial nas redes móveis este ano. O professor do IST não se pronuncia sobre os benefícios da entrada de novos operadores, mas recorda que Portugal destoa de outras realidades.

“Há países muito maiores que o nosso que só têm três operadores. E tem havido, inclusive, uma consolidação (aquisição) dos operadores em países onde existiam quatro operadores”, comenta Luís Correia.

Luís Correia guarda ainda um reparo para a distribuição de frequências que a Autoridade Nacional das Comunicações (Anacom) levou a cabo durante o leilão do 5G. A crítica tem origem no facto de se saber que o 5G só permite larguras de banda máximas de referência que chegam aos dois gigabits por segundo quando um operador dispõe de uma faixa que totalize 100 megahertz. Mas acontece que o leilão permitiu uma realidade diferente da referência desejada em termos de velocidade disponibilizada à população.

“A velocidade máxima que eu, como utilizador, poderei ter depende desse espectro que o operador tem. Se um operador só tiver 40 megahertz, que é o que acontece com alguns desses operadores que foram ao leilão, eles só vão ter 40% dos 2 gigabits por segundo”, conclui Luís Correia.

Tiago Pereira Santos

Hugo Séneca conversa com mentes brilhantes de diversas áreas sobre o admirável mundo novo que a tecnologia nos reserva. Uma janela aberta para as grandes inovações destes e dos próximos tempos.

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